quinta-feira, 4 de maio de 2023

GEO XADREZ: A «ABERTURA BRICS»

(Boletim nº 120 - Maio 2023)

«Os Vice-Ministros dos Negócios Estrangeiros e os Enviados Especiais do BRICS para o Médio Oriente e o Norte de África (MENA) reuniram-se em 26 de Abril de 2023, em formato híbrido, na Cidade do Cabo, África do Sul, para trocar opiniões sobre a situação actual na região.» Da qual faz parte o Sahara Ocidental.

«Em conformidade com o Direito Internacional»

A primeira referência formal à plataforma geopolítica formada pelo Brasil, Rússia, Índia e China (e daqui a designação BRIC) é de 2006, com a realização da sua primeira cimeira ao mais alto nível em 2009. Com a entrada da África do Sul em 2010 a sigla passou a BRICS. A rotina das suas cimeiras e a multiplicação das suas iniciativas — de que a criação do Novo Banco de Desenvolvimento em 2014 é um exemplo – tornaram-na um agente incontornável na luta pela nova hegemonia mundial, tendo vindo a crescer o número de Estados que pretendem integrá-la.
Do encontro na Cidade do Cabo saiu uma «declaração conjunta» onde é passada em revista a situação política, económica e social da região MENA e sugeridas pistas para a procura de soluções para os problemas com que se confronta.
A declaração começa por afirmar que os Vice-ministros «Consideraram que a crescente instabilidade e incerteza mundiais tiveram um impacto negativo na paz, segurança e desenvolvimento mundiais, incluindo na região. Defenderam o reforço do quadro multilateral das relações internacionais, opondo-se simultaneamente ao unilateralismo e promovendo a paz, a estabilidade e o desenvolvimento na região do Médio Oriente e Norte de África. (…). Salientaram a importância de abordar os conflitos e as questões de segurança através do diálogo e de consultas inclusivas de forma coordenada e cooperativa. Um Médio Oriente e um Norte de África pacíficos e prósperos são do interesse de todo o mundo.»
E mais à frente: «Reafirmaram o seu empenhamento no princípio básico de que a paz e a segurança na região MENA devem ser alcançadas e mantidas em conformidade com o direito internacional e a Carta das Nações Unidas (ONU) e no pleno respeito por estes princípios. Reafirmaram o papel primordial do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) na manutenção da paz e da segurança internacionais. Reconheceram o importante papel desempenhado pelas organizações regionais, incluindo a Liga dos Estados Árabes (LSA) e a União Africana (UA), na abordagem das ameaças à paz e à segurança, em conformidade com o Capítulo VIII da Carta das Nações Unidas. A este respeito, saudaram o papel desempenhado pela UA e o papel de liderança do Conselho de Paz e Segurança da UA (PSC) na promoção da paz, da segurança e da estabilidade no Norte de África.»
Os Vice-ministros também «Salientaram que a paz e a estabilidade na região do Médio Oriente e do Norte de África exigem a cooperação e a integração para o desenvolvimento. (…). Apelaram à comunidade internacional para que ajude os países [da região] MENA a atingir os seus objectivos de desenvolvimento.» E no que pode ser interpretado como uma crítica às posições dos países que se insurgem contra a invasão da Ucrânia pela Rússia enquanto olham com benevolência e cumplicidade a ocupação da Palestina por Israel e a invasão do Sahara Ocidental por Marrocos: «Além disso, salientaram a importância do papel de coordenação da ONU e a oposição à duplicidade de critérios.»
A declaração aborda depois oito situações concretas: cinco no Médio Oriente — Palestina, Síria, Líbano, Iémene e Iraque – e três em África – Sahara Ocidental, Líbia e Sudão – não referindo o problema do Curdistão, a mais antiga herança do colonialismo franco-britânico na região.
Sobre o processo de descolonização do Sahara Ocidental é dito no §13:
«Salientaram a necessidade de se alcançar uma solução política duradoura e mutuamente aceitável para a questão do Sahara Ocidental, em conformidade com as resoluções pertinentes do Conselho de Segurança da ONU. Manifestaram o seu pleno apoio à implementação da Missão das Nações Unidas para o Referendo no Sahara Ocidental (MINURSO), ao Enviado Pessoal do CSNU para o Sahara Ocidental e aos seus esforços para fazer avançar o processo político que resultará no reatamento do diálogo entre as partes envolvidas.»
É uma posição matizada, onde as afirmações rotineiras das últimas reuniões do CSNU coexistem com a afirmação do papel da MINURSO – a realização do referendo no Sahara Ocidental.
A declaração conclui afirmando que os Vice-ministros «Acordaram em reunir-se novamente sob a presidência russa em 2024. A este respeito, reiteraram a necessidade de realizar consultas regulares sobre o Médio Oriente e o Norte de África, nomeadamente na ONU. Decidiram realizar consultas intercalares anuais a nível de trabalho de preparação para a reunião dos Vice-Ministros dos Negócios Estrangeiros e Enviados Especiais do BRICS sobre o Médio Oriente e o Norte de África (MENA).»


 


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