quarta-feira, 5 de outubro de 2022

ONU: PROCESSO NEGOCIAL A “MARCAR PASSO”

(Boletim nº 113, Outubro 2022)

Nos princípios do passado mês de Setembro o Enviado Pessoal do Secretário-geral das Nações Unidas para a questão do Sahara Ocidental, Staffan de Mistura, iniciou uma nova ronda pela região do Magrebe. Sem resultados visíveis.

Devagar vai-se longe?

Recorde-se que em 2 de Julho De Mistura esteve em Rabat, onde o Ministro dos Negócios Estrangeiros marroquino Nasser Bourita o fez esperar durante horas antes de o receber. Tinha previsto visitar posteriormente o Sahara Ocidental ocupado. Porém, a visita foi cancelada no último minuto sem terem sido dadas razões oficiais para tal decisão.
Em finais desse mês o embaixador argelino Amar Belani, encarregado do acompanhamento da questão do Sahara e dos países do Magrebe, informou que Marrocos tinha tentado impor interlocutores “fantoche” nessa sua visita, levando o Enviado Pessoal a anular a deslocação. «As razões são óbvias e bem conhecidas», disse Belani. «Depois de terem sido muito relutantes em organizar esta visita aos territórios saharauis ocupados, as autoridades marroquinas quiseram impor interlocutores fantoches ao Sr. De Mistura, incluindo colonos disfarçados de "representantes eleitos" ou de organizações vassalas e satélites (…)». A decisão de De Mistura de adiar esta viagem, «em condições tão inaceitáveis e ofensivas, honra-o com razão e irá inevitavelmente exercer pressão sobre Marrocos, que é assim apanhado no acto de sabotar os esforços do enviado pessoal do SG da ONU», acrescentou Belani.
De Mistura iniciou no dia 3 de Setembro a sua segunda ronda pela região no quadro das «consultas com as partes interessadas» com o objectivo de alcançar uma solução para a questão saharaui, preparatória da sua intervenção na próxima reunião do Conselho de Segurança a ter lugar este mês Outubro. Desta vez, porém, a Argélia vetou o recurso à Força Aérea de Espanha para a deslocação do Enviado Pessoal, como tem sido habitual com todos os emissários da ONU, tendo este recorrido a um voo da Air Algérie. O argumento invocado por Argel é que Madrid, ao aderir ao plano de autonomia marroquino, tinha perdido idoneidade. «Porque adoptou uma posição parcial» sobre o conflito, «a Espanha foi desqualificada e não pode de forma alguma ser associada aos esforços para reactivar o processo político» na procura de uma solução, disse um alto funcionário governamental argelino.
A primeira paragem foi nos acampamentos de refugiados . Aí reuniu, «durante o primeiro dia, com a delegação saharaui responsável pelas negociações, composta pelo ministro da Cooperação, Fatma al-Mahdi e o representante da Frente POLISARIO na ONU, Sidi Mohamed Omar, e chefiada pelo chefe do Secretariado da organização política da Frente POLISARIO, Khatri Addouh, antes de realizar uma reunião individual com o Chefe do Estado-Maior, Mohamed Elouali Akeik.»
Reuniu também com representantes das organizações da juventude e responsáveis da União Nacional das Mulheres Saharauis, da qual fazia parte a sua Secretária-geral Chaba Seini. «Uma oportunidade para realçar a realidade vivida pelas mulheres saharauis, em particular a repressão e os abusos a que estão sujeitas nos territórios ocupados por Marrocos, bem como o seu papel na luta pela liberdade e autodeterminação.»
No segundo dia da sua estadia reuniu com o Secretário-geral da Frente POLISARIO e presidente da RASD, Brahim Ghali, assim como com membros do Conselho Nacional (o parlamento saharaui) e do Conselho Consultivo.
De Mistura viajou depois para Argel onde se encontrou com o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Ramtane Lamamra. O breve comunicado de imprensa do Ministério argelino emitido no final desta reunião exclui a participação da Argélia em qualquer tipo de negociações. Argel defende um diálogo directo entre as duas partes em conflito, a Frente POLISARIO e Marrocos, como, aliás, Lamamra repetiria na Assembleia Geral das Nações Unidas onde pediu «à ONU que apoiasse o Enviado Pessoal do Secretário-geral para o Sahara Ocidental para que as duas partes em conflito, Marrocos e a Frente POLISARIO, retomem as negociações directas a fim de chegarem a uma solução política "mutuamente aceitável" que garanta a autodeterminação do povo saharaui de acordo com os princípios e objectivos da Carta das Nações Unidas.»
De Mistura terminaria o seu périplo em Nuakchott, a capital da Mauritânia, onde se encontrou com o seu presidente, Mohamed Ould Ghazouani. No final da reunião não prestou declarações à comunicação social mas segundo a agência noticiosa EFE, citando uma fonte diplomática mauritana, «as discussões centraram-se nos resultados das visitas do enviado da ONU à região e no papel de Nuakchott na facilitação de uma solução para o conflito. Na reunião, Nuakchott reiterou a sua posição "neutra" sobre o assunto.»
Em finais de Outubro o Secretário-geral das Nações Unidas, depois de ouvir o seu Enviado Pessoal, apresentará ao Conselho de Segurança o seu relatório semestral sobre o processo de descolonização do Sahara Ocidental.


 

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